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Figueira da Foz, Coimbra, Portugal


Eu estou aqui, e tu?

Desde que cá cheguei por motivos de saúde em 2005, vejo me a ser aglomerado pelas rochas da maré baixa pouco a pouco, dia a dia sem eu mesmo aperceber-me disso. Questiono-me o que levou a minha família a sair do norte para pousar por estas bandas ainda que sejam bem norte do que muitas outras. As razões foram imensas, mas a que realmente me interessava era a essência desta maresia que se respira a cada raio de sol e mesmo de vento e chuva abundantes.

Falo de uma terra que tem serra, tem mar, tem oceano, tem rio, terras intermináveis, florestas e flora, calor, frio, chuva e sol. Penso eu que estou num paraíso, parece... pelo menos nós que apreciamos a Figueira tanto no Agosto como em Novembro e Fevereiro entendemos os dois mundos que são tão diferentes mas tão dependentes um do outro pelos menos nestes tempos de agora e ontem.

Já tive a oportunidade de ver, aprender, comer, e falar de tanta coisa desta região... Os ouriços do mar, o mexilhão, o Peixe da Costa de Prata, do rio, as enguias e as lampreias (caía-me o orgulho das receitas de família se não as retratasse aqui e agora)... o lingueirão, o polvinho! A carne marinhoa de alqueidão do senhor Jorge, as salinas da cova-gala onde já teimei com o Sr. José João que temos a melhor salicornia da peninsula ibérica, a broa de brenha da senhora Isabel, as capuchinhas e os limões das alhadas da minha rica Avó, as clementinas também... A batata doce e o bolbo de aipo, o nabo e os grelos daquela feira da confraria em Carapelhos, e o seu gin espectacular, a beterraba os pimentos e as courgetes que crescem a beira do mar de quiaios e que são enormes! Os enchidos do outro lado da serra, o morangueiro, os cogumelos das serras das alhadas, lousã e boa viagem, os míscaros, o arroz do mondego, o pão de água das padeiras escondidas, a broa de abóbora vendida em segredo, a broa de sardinha que digo-vos - do outro mundo - do mestre padeiro do GIS (grandes ensinamentos), as malaguetas que não são nossas mas que se dão em todas as varandinhas da rua, as flores e rebentos da horta parceira, a cebola branca que adora a sombra e a brisa leve dos arredores, os tomates que ainda não desapareceram mas que crescem mais devagar, os ovos das criações caseiras, as aves produzidas com toda a meiguice para o almoço de domingo, os espigos que vão dando uns olás de primavera, o azeite dos produtores caseiros, o vinagre de tinto dos produtores ainda mais escondidos, os figos pinguinho de mel, as nêsperas, as maçãs das terras mais de longe e bem perto, os tomarilhos que niguém gosta mas toda a gente compra um ou dois, as cenouras selvagens, o espinafre que se vê a crescer feito maluco em tudo o que é canto, as diversas couves que todos gostam de ter nas casinhas mais ornamentadas, o mel das abelhas que estão agora a acordar, o mirtilo, a nespera e a nectarina e tantos mas tantos outros, mas principalmente a frescura e a ternura de cada um deles... Que estão perto e isso é o mais importante.

Perceber o quão vasto é o catálogo para o cozinheiro se inspirar é de uma tremenda sorte...

Dar-lhes o devido uso já é outra história, mas isso vamos falando nos próximos tempos...

A vontade é imensa e o assunto ainda maior, descobrir esta região e em especial esta cidade é de grande obra e dedicação. Os meus ouvidos estão abertos, e os meus braços também, quem seja produtor da região que queira promover o que a Natureza dá de si que me procure, eu já vos procuro há uns bons pedaços de tempo..

Entendam devagar o porquê de uma nova era, ou de um novo respirar desta brisa que paira na marginal. Colegas passaram e outros cá estão, vamos então acreditar que a gastronomia de evolução não esqueçe as raízes, estas que se julgam cada vez mais em vão.

Estou de volta, por quanto tempo não sei, mas desta vez trago um pouco de mim para mais um pouco de ti, Figueira.


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